quinta-feira, outubro 23

Janelas

Pela janela do quarto, vejo a rua onde passei minha infância. Amizades terminaram e outras começaram, mas ela continua a mesma

Pela janela do hospital, vejo um belo flamboyant. Verde e laranja, ele cresce alheio aos dramas e percalços que ocorrem dentro daquele prédio.

Pela janela do ônibus, vejo a cidade a passar. Durante o dia ela é puro movimento. Todos correm por que estão apressados, o tempo todo atrasados. À noite as luzes se acendem e transformam a titã de pedra e concreto em uma obra de arte iluminada.
Pela janela do metrô eu vejo um mundo que passa depressa. Cena após cena, tudo se transforma em um borrão, ora colorido quando estamos na superfície, ora cinza e compacto quando estamos no subterrâneo.
Pela janela do avião, vejo megalópoles inteiras transformarem-se em formigueiros e percebo nossa pequenez diante da imensidão do mundo em que vivemos.

Quando abro um livro, abro também uma janela para um mundo paralelo. Por ela vejo coisas fantásticas, que me fazem viajar mesmo que eu esteja deitado no sofá de casa.

Quando ligo a TV, permito que aquela caixa se transforme em uma janela, e que atores e atrizes, jornalistas e humoristas desenhem para mim uma paisagem criada por eles.

Quando ligo o pc e acesso a internet, conecto-me com um mundo de janelas, todas abertas e mostrando qualquer coisa que possa ser interessante a qualquer um.

Quando me olho no espelho, deparo-me com uma janela-imitação. Chamo-lhe assim, pois esta somente reproduz o que vê.

Quando observo uma foto, vejo uma janela aberta para o passado que também deixa passar um fluxo ininterrupto de lembranças boas... ou ruins.

Quando observo uma obra de arte, vejo uma janela criada por um artista. Como uma esfinge, ela precisa ser decifrada, interpretada para que a paisagem real possa aparecer.

Quando converso com alguém olhando em seus olhos, me deparo com a janela mais bela e importante de todas. No fundo dela, se encontra a essência de uma vida. A única coisa que é inacessível ao empirismo humano. No fundo dos olhos, eu vejo a alma do outro, e mesmo que ela se esconda e construa barreiras para se proteger, sempre existe um brilho no olhar, diferente para cada um, que comprova sua existência.

Nossa vida é um eterno passar de janelas, e conseguir admirar e não somente ver o que elas nos mostram é um dom verdadeiro.